Faço uma resenha do livro As Vantagens do Pessimismo.
Foi minha estreia na obra do filósofo conservador Roger
Scruton. E gostei muito.
O livro é, em linhas gerais, uma defesa do princípio da
prudência e, assim, um alerta aos perigos da 'falsa esperança', uma crítica
aos 'otimistas inescrupulosos' (o eufemismo que ele usa para os esquerdistas).
"Os
otimistas inescrupulosos acreditam que as dificuldades e as desordens da
espécie humana podem ser vencidas por um ajustamento em grande escala: basta
inventar um novo arranjo, um novo sistema, e as pessoas serão libertadas da sua
prisão temporária para um reino de sucesso."
"O único melhoramento que está sob nosso controle é o melhoramento de nós
próprios."
Ele explica 7 falácias utilizadas por esses 'otimistas' e,
em seguida, apresenta algumas 'defesas pela verdade'.
A primeira falácia é a da Melhor das Hipóteses. O
esquerdista mira o ideal e não se preocupa com um 'plano de contingência' caso
a 'ideia' não dê certo, ou seja, não avalia todos os riscos para saber se
consegue bancar a pior das hipóteses (como um conservador o faz).
A falácia seguinte é a do Nascido Livre. O autor explora o
conceito de liberdade, associando-o aos conceitos de responsabilidade e
reciprocidade e diferenciando-o da simples 'ausência de restrições'. Liberdade inclui
respeitar o próximo e depende dos contextos culturais. Um exemplo significativo
que ele utiliza é o desastre da educação a partir da falta de disciplina do
'desconstrucionismo', que usa justamente o conceito distorcido de liberdade.
Em seguida, no capítulo sobre a Falácia Utópica, ele
evidencia os riscos de colocar as fichas numa utopia e como, paradoxalmente, as
utopias se fortalecem pela sua inexeqüibilidade.
"A
mente utópica é uma mente moldada por uma moral particular e uma necessidade
metafísica que leva à aceitação de absurdos não a despeito da sua
absurdidade mas por causa dela."
Na Falácia da Soma Zero há o pano de fundo para o eterno
confronto criado pelos esquerdistas entre opressores vs oprimidos (com os
atores se modificando; a versão atual é pobre x rico). Não aceitam a situação
indesejada como um 'fato da realidade'; sempre acham que foi causado por
outrem.
A Falácia do Planejamento é o arcabouço teórico para
coletivismos e Estados grandes. Os otimistas inescrupulosos acreditam que uma
meia-dúzia de Iluminados terão as soluções para os problemas do mundo e, assim,
desprezam a sabedoria cotidiana das micro-relações criadas ao longo da
história. Não percebem que as soluções não são impostas, mas descobertas ao
longo do tempo.
A penúltima, a Falácia do Espírito em Movimento, tenta nos
convencer que o Zeitgeist, o espírito do tempo, praticamente 'nos obriga' a
aceitarmos as mudanças, quase que abrindo mão de nossas liberdades e
individualidades. Os otimistas inescrupulosos se enganam (e tentam nos enganar)
ao associar o progresso científico a um eventual 'progresso moral ou de
costumes'. Scruton pontua que nada garante que uma geração será melhor que a
anterior do ponto de vista moral ou de costumes ou de cultura... (ao contrário
da ciência).
"A
falácia de ter uma visão retrospectiva de uma coisa que ainda não aconteceu tornou-se
parte integrante do pensamento progressista."
Por fim, com a Falácia da Agregação, os esquerdistas tentam
'somar' conceitos que costumam ser concorrentes, como no exemplo clássico de
liberdade x igualdade.
Em seguida, Roger Scruton expõe algumas estratégias através
das quais os esquerdistas utilizam as falácias apresentadas.
Diante do fracasso das soluções propostas pelos
esquerdistas, a desculpa é sempre que não foram 'longe o suficiente'. Invertem o ônus da prova: dizem
que os conservadores teriam que provar por que a dinâmica atual ('status quo'?)
é melhor que o 'melhoramento' proposto por eles, como se a simples sobrevivência
à prova do tempo já não fosse prova suficiente da funcionalidade (vis a vis a
'boa intenção' da ideia deles).
"O senso comum também diz que um costume que sobreviveu à prova do tempo tem pelo
menos isso para dizer a seu favor: que não é disfuncional."
Outra estratégia é a criação de falsos peritos (em assuntos em que simplesmente não há
peritos). Uma retórica embutida de sociologia amadora e dá-se crédito a
qualquer um.
Também costumam transferir
a culpa, sugerindo que o simples êxito já seja prova suficiente para
condenação. Um exemplo é rotular de odioso quem sofre o ódio. Nesse contexto,
costuma-se criar bodes expiatórios.
Tentam ser herméticos,
com discursos confusos, acusando ignorância de quem não concorda. (cita trechos de Marx e Althusser como exemplo)
O autor, então, imagina um mundo do jeito que os
esquerdistas querem: com ausência de restrições, todos iguais, sem
instituições, com soma zero (vive-se ou morre-se)... e chega ao nosso passado tribal!
Supõe, então, que esses impulsos esquerdistas talvez sejam resquícios dos
nossos antepassados.
"Leva
a uma conclusão algo deprimente, que é a de que as falácias que identifiquei
nesse livro como subjacentes às tolices do nosso tempo não são novos
acrescentos ao repertório da loucura humana mas os resíduos das tentativas
honestas dos nossos antepassados de endireitar as coisas."
Conclui dizendo que a vida civilizada não deve nos dizer o
que fazer, mas o que NÃO fazer uns aos outros. Lembra que destruir é muito mais
fácil do que criar.
"Devemos
reconhecer que o confronto em que estamos envolvidos não é político; (...) é um
confronto existencial."
"A
melhor comunidade a que os seres humanos podem aspirar: uma sociedade sem
convicção, na qual ninguém acredita ter o direito divino ou o dever histórico
de fazer guerra contra aqueles que discordarem de si."
O livro é muito bom!
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