Faço um resumo desse bom texto do ótimo Jarrett Walker,
acrescentando alguns comentários. (as figuras desse post são do texto original).
Em 'Por que dirigimos assim?' (que resumi aqui), Tom Vanderbilt argumenta (com
estudos) que o que mais incomoda o cidadão no trânsito não é o longo tempo em
si da viagem, mas, sim, a variação desse tempo. Exemplificando: o que mais
incomoda um aluno da cidade universitária de São Paulo que mora na zona leste
não é gastar 1 hora para atravessar a cidade mas, sim, que em vários dias, essa
1 hora vira 1 hora e meia (na prática, a felicidade de que, em alguns dias, ele
leve 'apenas' 40 minutos não compensa a frustração da demora nos outros dias).
Nessa mesma linha, Jarrett Walker defende como um dos
maiores pilares da política de mobilidade urbana a busca por FREQUÊNCIA ao invés de VELOCIDADE. O artigo que trago toca justamente nesse ponto.
Via de regra, os cidadãos se deliciam com uma linha de
ônibus que passe na porta do trabalho e os leve à porta de casa. Mas isso é
simplesmente impossível de atender em larga escala. Buscar esse objetivo é
jogar dinheiro fora e subaproveitar a malha de ônibus.
A alternativa, impopular (aliás, como a maioria das soluções
de verdade), é incentivar transferências (conexões, baldeações,...).
O exemplo clássico é o seguinte: imaginemos 3 origens e 3
destinos. Pra ligar ponto-a-ponto pra todo mundo, precisaremos de 9 rotas (A a 1, A a 2, A a 3, B a 1, B a 2, B a 3, C a 1, C a 2, C a 3).
Supondo tempo de viagem de 20 minutos e orçamento suficiente
para realizar cada viagem a cada 30 minutos, temos que cada viagem demorará
entre 20 minutos (você chegou no ponto bem na hora da porta aberta do ônibus;
tempo de espera = 0) e 50 minutos (você chegou no ponto bem na hora da porta
fechando; tempo de espera = 30 minutos). Na
média, 35 minutos.
A alternativa com transferência criaria um ponto de
conexão (vamos supor no meio do caminho de todo mundo). Nessa situação serão
necessárias apenas 3 rotas, todas passando por esse ponto central. Com o mesmo
orçamento e a redução de rotas num fator de 3, podemos aumentar a FREQUÊNCIA
das viagens em um fator de 3, ou seja, a cada 10 minutos. O tempo de viagem
será composto por: de 0 a
10 minutos pra pegar o 1º ônibus + 10 minutos da 1ª viagem + de 0 a 10 minutos para pegar o 2º
ônibus + 10 minutos da 2ª viagem; ou seja, entre 20 e 40 minutos. Na média, 30 minutos.
Repare que, se você tiver a 'sorte' de ter a viagem direta
(no exemplo, acontecerá em 1/3 das rotas), você ainda não terá o tempo de
espera do meio, ou seja, a média de viagem cai ainda mais.
Essa alternativa possui ainda mais vantagens do que apenas a
economia de tempo:
- é mais fácil pra
população entender as rotas; é mais mnemônico; haverá menos tempo perdido
com o motorista tendo que responder pra senhorinha se esse ônibus passa na
avenida x.
- a malha será mais
bem aproveitada; a tendência é que todos os ônibus sejam mais bem ocupados
(todo ônibus será, de fato, útil). Isso pode parecer uma desvantagem (ônibus
cheio é mais desconfortável), mas ônibus bem ocupado (não superocupado) é sinal
de bom uso do dinheiro público. Ou não existe a sensação de 'desinteligência'
ou desperdício quando pegamos um ônibus abarrotado e, na sequência, um ônibus
super vazio?
- menos rotas e mais curtas significam mais resiliência, mais capacidade de acertar um detalhe do trajeto
como um cruzamento-gargalo.
- a vantagem aumenta com o aumento da cidade. Basta
imaginarmos uma redução de rotas num fator de 10 e aumento da frequência num
fator de 10.
Existem três argumentos contra os transfers: um fresco, um
falacioso e um considerável.
A crítica fresca é que não terá mais viagens sentadinhas,
longas, para se ler um livro. Bem, aí a população precisa escolher se prefere
chegar logo ou chegar sentada. Frescura.
A crítica falaciosa condena o cálculo de espera lá de cima
no texto. Dizem que basta você saber a hora que o ônibus passa e se programar
pra ela, levando o tempo de espera sempre a zero. Quem vive a prática, sabe
que isso não é aplicável. Primeiro porque não sabemos ao certo a hora dos
ônibus. Segundo porque, mesmo que soubéssemos, nem sempre conseguiríamos nos
adequar. A frequência menor (mais tempo entre um ônibus e o próximo) levará a tempos de espera, mesmo que você saiba os horários. O exemplo no
post original é bom: se você tem que chegar ao escritório às 9h00, mesmo que
saiba que um ônibus passa às 8h05 e te deixará no escritório às 8h40, você
continuará perdendo os 20 minutos no trabalho por ter chegado mais cedo do que
precisaria (e o ônibus seguinte faria você chegar atrasado). Ou seja, essa
crítica é uma falácia.
A crítica boa é psicológica: o perrengue da
conexão. Ou seja, existe um 'penalty' maior do que simplesmente o tempo de espera
adicional na conexão.
Na verdade, tudo isso pode ser mensurado para vermos até que
ponto (até quantos minutos) o usuário aceita gastar mais na viagem direta do
que fazendo conexão (5 minutos? 10 minutos?). Obviamente, a conexão tem que ser
uma situação agradável e cômoda, sem ter que andar demais, por exemplo.
Pra tudo isso, claro, um cartão do tipo 'bilhete único' é
imprescindível.
Experimentei a teoria na prática e adivinhem: dessa vez, deu
certo. hehe. Comecei a pegar, de fato, o primeiro ônibus que passasse em frente
ao trabalho, sem nem saber o nome ou o número. No meu caso, confesso, era um
pouco mais fácil: ou ele pega a Av Santo Amaro (que me basta para rota
direta) ou sobe a Av Brigadeiro Luis Antonio. Nesse 2º caso, pulava do ônibus
assim que percebesse o 'desvio da minha rota', andava até a Av Santo Amaro e
pegava o primeiro ônibus que passasse, também sem saber nome ou número. Como a
entrada dos ônibus na Av Santo Amaro às vezes trava, acredito que em alguns dias, até
ganhei tempo ao pular de um ônibus e entrar no outro, já na Avenida.
Enfim, seria bom ter um prefeito com um pouco mais de
coragem para enfrentar o status quo e tomar uma decisão um pouco mais técnica
com relação à malha de ônibus.
Excelente, Batatinha! Vamos fundar um partido?
ResponderExcluirhahaha.
ResponderExcluirValeu, Edu.
Já prometi largar política umas 500 vezes na minha vida. Não consigo...
Muito bacana!
ResponderExcluirEngraçado ver que se aplica a mim, apesar de serem meios de transporte diferentes. Olha só...
Tenho duas formas de vir trabalhar: de ônibus ou de metrô. Pego o ônibus na rua de trás e ele me deixa exatamente em frente à corretora. Já para pegar o metrô eu preciso andar um pouco (bem pouco), e ele me deixa a duas quadras daqui. Além disso, no metrô eu tenho que trocar da linha verde para a amarela, o que me toma pelo menos uns 5 minutos, além do perrengue.
Fiz um controle mais preciso durante pouco tempo, mas o fato é que eu demoro, em média, uns 30 minutos de ônibus, e uns 35 de metrô. Só que o tempo do metrô não varia, já o do ônibus...
Em resumo: opto quase sempre pelo metrô, a não ser em dias que, por alguma razão, resolvo tentar chegar mais rápido: com sorte chego em menos de 20 minutos de ônibus! :-)