Há muitos anos, descobri o prazer da leitura. Mais tarde,
com curiosidade, desejo de aprender e influenciado por um ou outro amigo,
resolvi postergar o desejo de um mestrado, substituindo os cursos por leituras
mais ‘sérias’, mais formais. A ideia era fazer meu próprio curso, aprender o
que desse na telha. Ganhei amplitude, perdi profundidade. Nunca mais fiz uma
matéria da qual eu não gostava. E fiquei preparado para ser um ‘tudólogo’:
enrolar sobre quase todos os assuntos... hehe. E misturar assuntos diversos.
Essa introdução serve apenas para contextualizar uma
associação que fiz pela leitura de alguns livros que, a princípio, não teriam
nada a ver.
Começo com uma ideia do Nassim Taleb, de "Cisne Negro" e "Iludidos pelo Acaso", crítico do uso sem restrições da curva normal, com suas
caudas estreitas. Taleb defende a tese de que alguns eventos de grande impacto
são menos raros do que supostamente esperamos (os extremos da distribuição de
probabilidades – as caudas – são na verdade mais gordos). Os exemplos disso na
História são as guerras e revoluções que nos levaram ao mundo como é hoje.
Fosse a História feita apenas pelos dias comuns, estaríamos em um estágio muito
anterior. Ao ler esse trecho, imaginei 2 gráficos que se somam. Abaixo, o azul
representa a evolução cotidiana, de grão em grão, lenta e segura. O vermelho,
as revoluções e grandes mudanças, pontuais, ocasionais, um pouco caótico. A
soma, em preto, resulta a evolução da História da humanidade. Passos pequenos
somados a grandes saltos.
Retire 2 ou 3 grandes eventos ou grandes dias da História, e estaríamos em tempos MUITO diferentes. Analogia do tempo moderno: a Bolsa parece um ótimo investimento de longo prazo; retire (ou esteja fora dela) os 2 ou 3 dias com maiores valorizações e o rendimento total do período já não será bom.
Ok, e daí?
E daí que li também Nilton Bonder, o rabino cujo principal
assunto são nossos confrontos internos, nossos dilemas conscientes e
inconscientes. Com paródias judaicas (lembrando que sou bem católico...), ele
passeia por filosofia e psicanálise. Gostei muito. ‘Alma imoral’ e ‘Segundas
intenções’ são embates sobre a imoralidade da alma com a moralidade do corpo, o
bom versus o correto, a evolução versus a preservação. (O jogo das capas dos livros é bem legal: aqui e aqui). Ao longo do texto, fui completando
a tabela abaixo. E percebendo que nossas vidas são pequenas versões dos
gráficos acima. A grande maioria dos dias é comum, mas nossa vida é
fundamentalmente marcada pelos poucos momentos atípicos, por acaso, fora de
controle. Uma mesmice com pequenos picos de grandes mudanças. Uma topada com
certa pessoa, uma demissão, um acidente de carro, um convite, uma ruptura.
Retire 2 ou 3 grandes momentos da vida e estaríamos em outro estágio.
Tanto a composição dos gráficos como a ideia de que pequenas
estruturas formam estruturas maiores idênticas são baseadas nos fractais de Mandelbrot.
A vida é um fractal da história da humanidade.
Ao longo dos textos, fui pensando também sobre as
implicações políticas ou, mais que isso, nas minhas discussões diárias (já que
gosto de discutir...). Será que eu estava delirando, querendo encaixar o mundo
ao meu pensamento (e não o contrário), fazer o convidado do tamanho da cama (e não o contrário)? No final de ‘Segundas intenções’, fui presenteado com uma
seção voltada mesmo pra política – liberais versus conservadores – tal como eu
vinha imaginando ao longo dos textos. Não viajei sozinho.
Não gosto da ideia de que essa separação política não faz
mais sentido porque não me considero parte do mainstream esquerdista
contemporâneo, não gosto desse ‘é-tudo-a-mesma-coisa’, já que não quero a
‘mesma coisa’ que está aí. Não acho legal tudo caminhar para o centrismo, para a peemedebização. E os livros me permitiram categorizar, rotular algumas dessas
diferenças.
Em essência, a direita é o corpo, é a linha azul lá de cima.
A esquerda é a alma, a linha vermelha lá em cima.
Em essência, o dia-a-dia tem que ser direitista, com
cuidado, com regras, com preservação (Daí, acho que em geral os governos devem
ser direitistas). Mas os grandes eventos, as grandes conquistas da humanidade
foram realizadas por gente que pensou fora da caixa, esquerdistas, alma. Mas
não dá pra ter uma situação esquerdista, é muito “vida-loka”. Direita como
default, esquerda como conquista.
Do mesmo modo, em essência, nossa vida tem que ser com
cuidado, com regras, com disciplina. Mas os grandes momentos da vida são
imorais, são alma, um pouco caótico e sem controle.